Foi tudo de bão. Bão, bão, bão, bão. Com a repetição da palavra, criando uma sonoridade retumbante, a artista e professora Carmen Luz fez da sua aula magistral uma performance. Fazendo todos os presentes pensarem juntos sobre a origem dos gestos., além de buscarem a reflexão sobre versos e quais estratégias de futuro poderão ser criadas e aprendidas. A brincadeira do tipo telefone sem fio no início da aula deu o tom de que as palavras e ideias estariam em movimento.
Em companhia da curadora e gestora cultural Sônia Sobral, e da artista Princesa Ricardo Marinelli, Carmen trouxe 5 movimentos para nortear a aula: Mercedes Baptista, Tia Lúcia, Aldione Sena, funk e passinho.
Carmen convida a olhar a história da bailarina Mercedes Baptista para além da epítome “primeira bailarina negra do Theatro Municipal do Rio de Janeiro”. E sim, reconhecer a importância pedagógica que Mercedes construiu para quase tudo que se conhece hoje como dança afro-brasileira.
E sacar a genialidade dela: como é que em 1952, uma coreógrafa negra de uma companhia inteira de bailarinos pretos lotavam os cassinos cariocas?
O movimento 2, Tia Lúcia, refere-se a uma artista auto-residente so MAR- Museu de Arte do Rio, baiana, que reivindicou o seu lugar de artista morada da Pequena África no museu que chegava no espaço. E Aldione Sena, o terceiro movimento, é 2 vezes Estandarte de Ouro e dançou no maior palco do mundo que é o carnaval. Carmem a trouxe para se pensar o samba para além da música, e sim para o samba dos pés: a dança.
E por falar em corpo, a professora trouxe o movimento passinho como conceito de bricolagem, brincadeira de criança na sua essência. E o funk como um grande deboche. Estilos de dança nascidos nos becos das favelas brasileiras, lugares estes habitados majoritariamente por nordestinos, pessoas pretas e pobres. E o que todos esses movimentos têm em comum?
“Não havia apenas uma pedra no caminho delas. Havia pedregulhos na escuridão e mesmo assim eles saltaram. Elas saltaram de nave em nave da realidade à utopia. parece que os saberes profundos já estavam nelas”, conclui Carmen Luz.
Sankofa. O conceito africano, dos povos que falam a língua Akan, de retornar ao passado para construir o futuro, é o ponto que une todos os cinco movimentos trazidos por Carmen, que invoca a frase de Ailton Krenak, “o futuro é ancestral”. Criar futuros é sonhar o sonho daqueles que nos sonharam.
“A celebração é uma estratégia radical para materializar processos de emancipação. Mas sem negação do triste, porém o negativo não prepondera, pois é o nosso lugar de enfrentamento. Não há contradição.” convida Carmen.
*A aula magistral com Carmen Luz aconteceu no dia 15/9, no Sesc Campinas, e abriu caminhos para a programação de atividades formativas da 13a Binenal Sesc de Dança. Até o próximo mergulho!